segunda-feira, 9 de junho de 2014

P505: CRÓNICAS DO JERO

Mais uma história subtraída ao JERO - com a devida vénia, claro!

CHINEL Nº.5

Uma recente brincadeira no “facebook” fez-me recordar o que muito chinelei nos meus tempos de comissão no Norte da Guiné (Binta-Farim) já lá vão muitos anos (1964-66).

Não há nada como ter vinte e poucos anos e ter a arte de desenrascanço que nasce connosco, portugueses.

Quem era então mobilizado para a Guerra do Ultramar já tinha feito recruta, especialidade e vivido alguns meses de vida militar em quartéis. Nesses tempos calçavam-se “botas da tropa” que tinham que se manter impecavelmente engraxadas. Não só “intramuros” mas, principalmente quando se vinha para a rua e se podia ter um “mau encontro”, com uns camaradas de que ninguém gostava: os polícias militares.

Feito este intróito, comum a todos que foram para África entre 1961 e 1974, tivemos que nos adaptar a viver dois longos anos em clima tropical.

Quem estava no “mato” não andava sempre em operações militares e no quartel (pomposo nome que se dava, normalmente, a um conjunto de barracões circundado por arame farpado) vestia – quando não estava de serviço – uns calções e pouco mais. Neste “pouco mais” é que entrava o “chinel nº. 5”…

E passadas umas semanas toda a gente chinelava "à maneira", como se sempre o tivesse feito durante toda a vida. 
E o “chinel nº. 5” fazia correr alguns riscos aos utilizadores, como bem alertavam os médicos e enfermeiros. 


Com efeito podia-se  contrair a dracunculíase (infecção pelo Verme da Guiné) ou a elefantíase. Como, infelizmente, se podia constatar em muitos elementos da população africana.

Mas está claro que “isso” só poderia acontecer aos outros… e vá de usar o “chinel nº. 5”, sendo certo que a maioria escapou a problemas de saúde.

E quanto ao verdadeiro, o autêntico “Chanel nº. 5”, quem o usaria?

A partir daqui o que se deixa escrito é meramente especulativo.

Se este "produto" bem cheiroso andou na guerra só poderia ter acontecido em Estados Maiores... ou lá perto, ou seja, em cidades afastadas do "mato", onde decorriam jantares e festas com a presença de Senhoras de Oficiais.
                  
Sinceramente veio-me à ideia a Cilinha (Cecília Supico Pinto), mas se o usou bem o mereceu, pois visitou no mato muitos militares.

Aí o Chanel nº. 5 terá “convivido” perfeitamente com o Chinel nº. 5!!!

JERO (ex-chineleiro nº.5)

3 comentários:

joaquim disse...

Belo texto Jero.

Também usei o "chinelnº5" mas nunca me adaptei bem à coisa!

Abraços
Joaquim

Hélder Valério disse...

Sim senhor, boa recordação do Jero!

Acho que "todo o mundo" usou esse tipo de "chinel" (na época era mais vulgar chamarem-lhe 'romanas', agora é mais 'abrasileirado', fruto dos novos tempos).
O pessoal usava-o para ir aos duches e quase sempre que não estava de serviço.
Quanto aos 'aromáticos'... isso aí já tem algumas nuances...
Olha que conheci vários casos, várias situações que, mesmo no mato, o pessoal fazia questão de quebrar a situação e 'aromatizar-se'.
Em Piche havia quem recebesse a "Playboy" e fosse influenciado pela publicidade ao "Brut" de "Fabergé" e o encomendasse e recebesse e usasse. Outros, mais correntes na época, também eram utilizados. Recordo-me agora mesmo do caso do "Dior" que um amigo fazia questão de utilizar "para afastar os maus cheiros"...

Enfim, outros tempos!
Hélder Sousa

Anónimo disse...

Jero, tem cá uma imaginação formidável. Está engraçada a estória e a comparação entre os perfumes e águas de colónia com o "Chinel nº5". Também os usei, não para as "evacuações aéreas", mas para os usar nos estrados de madeira, nos chuveiros das casas de banho. Um abraço. Mª Arminda