terça-feira, 10 de julho de 2012

P247: Recordações da memória – o Jamil

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Na Guiné, que me lembre, tive apenas um amigo civil, com quem partilhei longas conversas e uma amizade sincera.

Tratava-se do Jamil Nasser, comerciante libanês no Xitole, com quem logo desde o início da minha estadia de “férias” naquele lugar, estabeleci relações de companheirismo e amizade.

Assim, era muito rara a tarde em que ao fim do dia não me dirigia para sua casa, para, no alpendre/varanda que dava para a estrada Bambadinca/Xitole, beber com ele uns “uísques”, acompanhados de pedaços de tomate vermelho salpicados com sal grosso.
Poder-se-ia pensar que tal ligação não combinava, mas digo-vos que era uma coisa de se lhe “tirar o chapéu”.

Ali estávamos, uma ou duas horas, conversando e ouvindo as noticias em árabe, o que, como podem calcular, a mim me dava imenso jeito!!!

O Jamil, se bem me lembro, era o primogénito de uma grande família libanesa, de posses, mas que tudo perdeu na guerra daquele país.
Para que os seus irmãos mais novos pudessem estudar, o Jamil demandou terras da Guiné, onde se estabeleceu no Xitole, enviando dinheiro para os seus irmãos no Líbano.
Um dos seus irmãos chegou mesmo a Ministro dos Negócios Estrangeiros do Líbano, (segundo sua informação), e embora já estivessem todos bem, o Jamil, habituado à Guiné, já não quis regressar à sua terra natal.

A fotografia aqui colocada, foi tirada no fim de um almoço que o Jamil ofereceu na sua casa, em Abril de 1972, (julgo que tendo como “desculpa” o meu aniversário), cuja ementa foi um saborosíssimo chabéu, coisa que eu nunca tinha comido na minha vida.

Lembro-me que uns dias antes o Jamil me pediu para o ajudar a carregar a arca frigorifica com garrafas de vinho branco, para ser mais preciso duas caixas de 12, e eu lhe ter dito que era demais, pois eramos cerca de 12 pessoas!
Ele respondeu que se beberia tudo e se calhar não chegava!

Percebi depois porquê, porque ao meter a primeira garfada do chabéu à boca, pareceu-me que tinha engolido uma fogueira!
O Jamil disse para insistir, porque depois das três ou quatro primeiras garfadas, a boca se habituava ao picante e depois é que se podia saborear o chabéu.

E assim foi, sem dúvida, pois não me lembro de comer outro tão bom como este!

É curioso que por vezes tenho saudades desses fins de tarde no Xitole!

Hei-de voltar ao Jamil Nasser e a outras histórias com ele.


Monte Real, 10 de Julho de 2012
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1 comentário:

paulo santiago disse...

Estou a ver o Jamil com um lenço entre o colarinho e o pescoço para absorver o suor enquanto o nível do
whisky ía baixando na garrafa.Foi com ele que conheci essa do tomate com whisky...sabia bem !!!
Comi alguns almoços em casa dele,o "criado"era um excelente cozinheiro e o "chabeu"óptimo...
Aos Domingos,no tempo da CCAÇ 2701,o Jamil ía com frequência almoçar ao Saltinho,e após almoço eram umas duas garrafas de scoth e uns quantos tomates a serem aviados.
O Jamil era tio de um jornalista da revista Manchete,muito conhecido no Brasil,e também em Portugal,chamado David Nasser.